quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Ouro Preto sedia 9º Encontro Nacional de História da Mídia

O 9º Encontro Nacional de História da Mídia será realizado de 30 de maio a 1º de junho de 2013, no Centro de Convenções de Ouro Preto (MG), sobre o tema central “História da Comunicação ou História da Mídia? – Fronteiras conceituais e diferenças”, numa realização da Associação Brasileira de Pesquisadores de História da Mídia (Alcar).

A organização do evento é do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) que realizou este ano, com grande sucesso, o Intercom Sudeste 2012. A Comissão Organizadora está preparando uma densa programação acadêmica e cultural com o objetivo de realizar um congresso de qualidade.

Já estão sendo finalizadas parcerias com a rede hoteleira de Ouro Preto para facilitar a hospedagem dos congressistas. Para quem preferir ficar nas tradicionais repúblicas da cidade, muitas delas vão receber os participantes do evento pela diária de 15 reais, incluindo o café da manhã.

As inscrições estarão abertas de 1º de março a 19 de maio de 2013 e o valor da taxa varia de acordo com a data, titulação e filiação à Alcar. A submissão de trabalhos estará aberta de 1º de março a 22 de abril de 2013.
O evento também vai realizar a segunda edição do Prêmio José Marques de Melo de Estímulo à Memória da Mídia, uma exposição de trabalhos científicos para alunos de graduação.

Os artigos para apresentação no evento podem ser inscritos em um dos Grupos de Trabalho da Alcar (relação abaixo).

Todas as informações sobre o 9º Encontro Nacional de História da Mídia estão disponíveis no site http://www.jornalismo.ufop.br/historiadamidia ou pelo e-mail historiadamidia@icsa.ufop.br. O evento também já está nas redes sociais: Facebook (www.facebook.com/HistoriaDaMidia) e Twitter (@HistoriaMidia). O blog http://www.jornalismo.ufop.br/ouropreto mapeia Ouro Preto para o congressista, com dicas de alimentação, hospedagem, pontos turísticos, transporte e saúde.

https://www.facebook.com/HistoriaDaMidia

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Encontro Regional de Comunicação recebe trabalhos até 28 de novembro

As inscrições de trabalhos para  X Encontro Regional de Comunicação (Erecom) já estão abertas e vão até o próximo dia 28. Organizado pela Faculdade de Comunicação (Facom) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), o encontro, entre 12 e 14 de dezembro, integrará outros quatro eventos: o III Seminário de Pesquisa em Comunicação (ComPesq), promovido pelo Programa de Educação Tutorial (PET); a I Jornada Interna do PPGCom, organizada pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM); o I ComunicAcesso, promovido pela Acesso Comunicação Júnior; e o III Seminário de Pesquisa e Mercado, organizado pelo curso de Pós-Graduação em Comunicação Empresarial.

Cada trabalho a ser inscrito deve ter tema relacionado com um dos seis Grupos Temáticos (GTs) do evento: Teorias e Interfaces da Comunicação; Jornalismo; Rádio, TV e internet; Comunicação Empresarial e Relações Públicas; Publicidade e Propaganda; Cinema.

Os textos devem ser formatados em papel A4; fonte Times New Roman; corpo 12; margem de 3cm (superior e esquerda) e 2cm (inferior e direita); mínimo de sete e máximo de dez páginas, incluindo bibliografia, em espaço duplo; com resumo de até sete linhas, com três palavras-chave, além da identificação do autor (nome, titulação, instituição, área de atuação).

As inscrições para o Erecom ainda não estão abertas, mas estudantes de Comunicação de qualquer instituição de ensino, professores, pesquisadores e profissionais da área podem enviar seus trabalhos para o e-mailsecretaria.facom@ufjf.edu.br.

Outras informações: (32) 2102-3611 (Faculdade de Comunicação)


Texto disponível na página da Secretaria de Comunicação da Universidade

A cidade atrás das manchetes


Houve tempo em que, por detrás do majestoso epíteto de “Manchester Mineira”, se escondia o horror do trabalho nas fábricas de Juiz de Fora. Às lutas operárias deve-mos o aprimoramento, ainda que precário e imperfeito, das relações entre capital e trabalho, mas uma inteira cidade permanece oculta por detrás das manchetes dos jornais e dos noticiários televisivos. Uma Juiz de Fora invisível à imprensa local.

Um amigo nascido e criado no bairro da Creosotagem (e haverá ainda memória sobre o tempo e o lugar que este nome evoca?) dizia-me certa feita que a incipiente relação entre a imprensa e a cidade podia ser dimensionada pela profusão de cartazes nos tapumes e de “filipetas” distribuídas no Calçadão da Halfeld. Está em jogo aqui a própria função social do jornalismo, os seus princípios básicos como instrumento de reflexão (no sentido intelectual e ótico) sobre e da comunidade.

Neste sentido, cumpre a todos nós, jornalistas, leitores e telespectadores, definir estratégias de restabelecimento da consangüinidade entre Juiz de Fora e a imprensa local, reaprendendo a lição do velho jornalista francês: “Um incêndio no Quartier Latin interessa mais do que uma Revolução em Cuba”. Não, meu caro leitor, não se trata de propugnar por uma imprensa provinciana, tacanha, interessada tão-somente no pitoresco e no folclórico. O que se pretende é uma imprensa capaz de desvelar a polifonia de uma cidade de 500 mil habitantes, de registrar as suas misérias e as suas grandezas, de escavar os tempos e lugares ocultos sob a pátina dos discursos oficiais e oficiosos.

Houve épocas em que a imprensa local era menos afeita aos press-releases e entrevistas coletivas. A tarefa diária dos jornalistas se confundia com o perder-se na cidade para fazer de seus textos e fotografias o fio de Ariadne com que os leitores podiam penetrar nos enigmas da Juiz de Fora concreta e cotidiana. E se o ritmo das redações dificultava esta tarefa, havia os cronistas locais, empenhados em inscrever no livro de registros da cidade os acontecimentos efêmeros, as personagens anônimas, os dramas mínimos, as paisagens transitórias.

Onde os jornalistas capazes de descentralizar o noticiário para atingir as margens? Onde os cronistas que humanizam os espaços da cidade, doando sentidos, personagens e movimentos à nossa cena cotidiana? Onde os jornais impressos e televisivos em que Juiz de Fora seja protagonista, e não mera figurante ou estilizado cenário? Restabelecer a relação especular dos meios de comunicação com a cidade é tarefa de todos nós, pois não podemos descurar do papel fulcral da imprensa na construção da imagem e da identidade cultural de Juiz de Fora. Sem espelhos que reflitam a cidade, sua história, seus centros, suas margens, torna-se impossível perceber que a proposição do Plano Estratégico da Prefeitura Municipal de uma cidade-educadora é apenas a reiteração do que já fomos e, apesar das políticas públicas, continuamos sendo. Esta uma de nossas muitas faces ocultas, construída por gerações de anônimos professores, embora precariamente figure nos noticiários.

Por Fernando Fiorese

[Da série “Plano estratégico de Juiz de Fora”, 06]
Série de nove crônicas publicadas originalmente no jornal 
Tribuna de Minas de maio a setembro de 2000, 
por ocasião das comemorações dos 
150 anos de Juiz de Fora.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

A cidade como signo*


Em conversa recente, o poeta e amigo Edimilson de Almeida Pereira me dizia: “Não sei se amo esta cidade, sei apenas que, cada vez mais, ela me interessa como signo”. E haverá outra forma, mais vertical e delicada, de amar uma cidade? Atenção e cuidado, embora sem desconhecer a crítica. Um sentimento que se realiza na “distância amorosa” (feliz expressão de Roland Barthes) e nos vários poemas que, em Águas de contendas (vencedor do Concurso Nacional de Poesia “Helena Kolody”, 1997), Edimilson dedica à leitura afetiva da cidade. Uma poética topográfica, exemplo cabal de que, mesmo secretamente, empenham-se os artistas locais em dar a ver a Juiz de Fora dos nossos medos e encantamentos, das nossas esperanças e ilusões perdidas.

Nas páginas de Águas de contendas, o registro de personagens e lugares, datas e paisagens, nos quais apenas o olhar do poeta pode surpreender a manifestação da cidade plural que habitamos. Ali estão o Caminho Novo e os descaminhos do Shangai, a geometria rasurada do painel de Portinari e a chama da igreja do Rosário, as imagens do centro produzida pela Neo-Carriço Films e os arrabaldes do presente e do passado. Todas as cidades, a cidade. Talvez mais do que as obras anteriores de Edimilson, Águas de contendas demonstre a eleição afetiva de Juiz de Fora como signo poético a ser decifrado, especulado, desdobrado.

Decerto tal atitude pode ser encontrada na memorialística de Pedro Nava e Rachel Jardim, na poesia de Murilo Mendes e Affonso Romano de Sant’Anna. Mas a estes foi necessária a distância física e sentimental, enquanto uma nova geração, representada não apenas por Edimilson, mas também por Iacyr Anderson Freitas e Marta Gonçalves, dentre outros, ainda insiste em habitar a Juiz de Fora concreta e presente para criar as imagens e textos que nos permitam, nos desvãos das palavras, encontrar as figuras, tempos e espaços que constituem a nossa pequena história pessoal.

Embora poucos saibam ou reconheçam, as obras destes poetas tornou Juiz de Fora conhecida em Minas, no Brasil e no exterior como a cidade onde se produz uma poesia das mais importantes e criativas da atualidade. Não por acaso, embora poucos saibam ou reconheçam, a crítica especializada e o meio acadêmico cada vez mais se debruçam sobre a obra destes poetas. Pena que, dentre os que não sabem ou não reconhecem, estejam principalmente as instituições públicas e privadas locais.

Enquanto Porto Alegre, Rio de Janeiro e Curitiba criam coleções de livros que procuram tornar visíveis tais cidades, aqui desperdiçamos a imagem que, ao longo de 150 anos, silenciosa e arduamente, poetas, escritores, artistas plásticos, fotógrafos e dramaturgos construíram de e para Juiz de Fora. Tais imagens, textos e encenações são elementos fundamentais para nos reconhecermos e sermos reconhecidos. Apenas quando essas obras se tornarem um patrimônio coletivo, Juiz de Fora será capaz de traçar as estratégias que concretizem em ruas, parques, pontes e construções a cidade que imaginamos, que desejamos.

Por Fernando Fiorese


*Série de nove crônicas publicadas originalmente no jornal Tribuna de Minas de maio a setembro de 2000, por ocasião das comemorações dos 150 anos de Juiz de Fora.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Compartilhar a cidade*

A Profa. Dra. Maria Margarida Martins Salomão, atual Reitora da UFJF, disse-me certa vez que Juiz de Fora tem uma luz estranha. Desde então, compartilho com ela desta cidade iluminada por uma incógnita.

O poeta Iacyr Anderson Freitas contou-me da visão de um guarda na Praça Antônio Carlos, posteriormente materializada num belo poema. Desde então, compartilho com ele deste lugar e deste personagem.

O pintor Dnar Rocha, mesmo sem o saber e desconhecendo quem seja este cronista, revelou-me cores e paisagens desconhecidas de Juiz de Fora. Desde então, compartilho com ele desta cidade plástica.

No livro A idade do serrote, Murilo Mendes transforma em prosa poética os personagens e acontecimentos da sua Ítaca perdida. Desde então, compartilho com ele desta cidade cercada de mulheres e pianos por todos os lados.

Algumas das peças escritas por José Luiz Ribeiro, diretor do Grupo de Teatro Divulgação, fizeram-me enxergar o passado e o presente de Juiz de Fora com a ironia e o lirismo que caracterizam a obra do dramaturgo. Desde então, compartilho com ele dos bastidores e do proscênio desta cidade.

Desde que nos conhecemos, minha mulher desvelou-me a sua meninice entre os bondes e as personagens do bairro São Mateus. Desde então, compartilho com ela da infância idílica que não tive em Juiz de Fora.

O poeta Edimilson de Almeida Pereira descreveu-me recentemente um crepúsculo visto de dentro de um ônibus na margem esquerda do Paraibuna. Desde então, compartilho com ele desta fugidia cena urbana.

As memórias de Pedro Nava nos oferecem um inventário das misérias e das grandezas de Juiz de Fora nas primeiras décadas deste século. Desde então, compartilho com ele deste Baú de ossos.

As obras dos artistas plásticos Stheling e Gérson Guedes me mostraram ângulos inauditos da arquitetura de Juiz de Fora. Desde então, compartilho com eles das texturas e das luzes desta cidade sonhado com pincéis.

Outros tantos foram pródigos em textos e imagens. Compartilho com eles da cidade que houve e não ouve a sua própria história, empenhada que está por inteiro no processo de desconstrução e construção. Les cités vont vite – e com elas as referências que nos permitem habitá-las, descobrindo numa qualquer fachada não o fóssil do passado, mas o animal vivo do nosso imaginário. O que fora urdido por nossas próprias mãos, como espelho, torna-se labirinto, Babel de todos e de ninguém.

Não quero a cidade imobilizada como museu a céu aberto. Não quero a cidade a cultuar cadáveres e naturezas mortas. Quero a cidade das passagens que as galerias do centro concretizam. Passagens onde possa transitar entre a geometria bruta dos edifícios de estética duvidosa e as curvas transtornadas do art nouveau. Passagens para a confluência dos tempos, para estratégias de leitura de uma cidade que todos escrevemos.

Fernando Fiorese

* Texto da série “Plano estratégico de Juiz de Fora", publicada originalmente no jornal Tribuna de Minas de maio a setembro de 2000.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

A cidade e suas perspectivas civilizatórias


A cidade ocupada e modificada pelas intervenções humanas e constituída também por ordens imaginárias revela as figurações das identidades que demarcam as ruas e também os rompimentos que introduzem a desordem das experiências e dos relatos.
Intervenções desencadeadoras de ações intencionais que transformam homens e mulheres em personagens, sujeitos que se apropriam dos espaços públicos – com eles interagindo ora de forma harmônica e equilibrada, ora de maneira conflituosa e insidiosa, na tentativa de converter os espaços em “lugares meus” (Borelli e Rocha, apud Pryston, 2005).

O tecido da cidade é produzido pelos movimentos humanos, através dos fatos sociais, territoriais e culturais.

Trata-se, de certa forma, de uma cidade cindida em cenários, assim como, cindida está a sociedade da qual ela é parte constitutiva; sociedade transformada e distanciada da ideia clássica que pressupõe uma “cena única e nacional”, em que as comunidades se vinculavam “a um território, a uma língua e a certas tradições” (Sarlo, apud Pryston, 2003, p.56-57)

Assim como se alteram as sociedades e as subjetividades, as cidades se transfiguram. Nessa cidade disseminada vive-se a tensão. “Hoje imaginamos o que significa ser sujeitos não apenas de nossa cultura de origem, mas também de uma variedade de repertórios simbólicos e modelos de comportamento. Podemos cruzá-los e combiná-los” (Canclini, apud Pryston, 2004, p.161). E nesse sentido desvendar como a cidade é imaginada por seus habitantes é perguntar-se sobre qual o sentido que eles atribuem à cidade em que vivem a demanda
“O sentido da cidade se constitui no que a cidade dá e no que não dá, no que os sujeitos podem fazer com sua vida em meio às determinações do habitat e o que imaginam sobre si e sobre os outros para suturar as falhas, as faltas, os desenganos com que as estruturas e interações urbanas respondem a suas necessidades e desejos (Canclini, 1995, p.91).

Renato Gomes comenta na obra “Todas as cidades, a cidade” sobre a dificuldade de entender o código da cidade, devido a sua constante transformação. Ele define a cidade como “linguagem dobrada, em busca de orientação”. No livro “Espécies de espaço”, o autor reflete sobre a cidade como metrópole, um fenômeno da modernidade em que “a arena cultural indica um campo de batalha simbólico (das artes e das indústrias da cultura) que, na sua polifonia, faz da cidade o palco de uma guerra de relatos” (GOMES, 2008, p.181).

E nesse campo de disputas, dentro ou fora da lei a cidade é feita por pessoas que consomem e, quem fica a margem, é considerado um monstro. Rubem Fonseca no conto “O outro”, por exemplo, não pensa na sociedade polarizada de classes, mostrando como os favorecidos e os desfavorecidos criminalizam a cidade. O autor fala de um lugar de culpa com as ambigüidades que produzem a violência. O intelectual tem uma crise por militar pelos pobres e não pertencer à classe deles. Além disso, reflete sobre a invisibilidade existente nos grandes centros, tema tratado em “A Ralé Brasileira” por Jessé Souza.

O ponto principal para que essa ideologia funcione é conseguir separar o indivíduo da sociedade. Nesse sentido, toda deter­minação social que constrói indivíduos fadados ao sucesso ou ao fracasso tem que ser cuidadosamente silenciada. É isso 'que permite que se possa culpar os pobres pelo próprio fracasso. É também o mesmo fato que faz com que todo o processo familiar, privado, invisível e silencioso, que incute no pequeno privilegiado as predisposições e a "economia moral" — o conjunto de predis­posições que explicam o comportamento prático de cada um de nós — que leva ao sucesso — disciplina, autocontrole, habilidades sociais etc. —, possa ser "esquecido". O "esquecimento" do social no individual é o que permite a celebração do mérito individual, que em última análise justifica e legitima todo tipo de privilégio em condições modernas. É esse mesmo "esqueci­mento", por outro lado, que permite atribuir "culpa" individual àqueles "azarados" que nasceram em famílias erradas, as quais só reproduzem, em sua imensa maioria, a própria precariedade. Como, no entanto, o social, também nesse caso, é desvinculado do individual, o indivíduo fracassado não é discriminado e humilhado cotidianamente como mero "azarado", mas como alguém que, por preguiça, inépcia ou maldade, por "culpa", portanto, "escolheu" o fracasso (SOUZA, 2009, p.42). 

A cidade acaba por perder o seu sentido porque ela nega essa diferença, tentando reduzir a alteridade para não produzir identidade. Para esmiuçarmos melhor tais questões nos apoiamos nas reflexões de Janice Caiafa que parte do princípio de que a marca das cidades é a circulação e a dispersão. A autora comenta que as cidades crescem concentrando e misturando seus habitantes, criando problemas de circulação. As formas como as diferentes cidades resolvem esses problemas é que vão caracterizá-las e definir muito da vida social nesses contextos. “A circulação tornava possível a ocupação do espaço público, produzindo a cidade como grande centro que atraía uma população diversa em sua composição e que em algum grau se misturava num espaço partilhado” (CAIAFA, 2007, p.31).

Caiafa também apresenta a sua interpretação de Guattari sobre a função subjetiva da cidade. Tal função é gerada pela falta de coletividade no meio ocupável com a inviabilidade de territórios existenciais – éticos e estéticos.
Os encontros serão entre iguais e conhecidos e vão se restringir a meios controlados e previstos, como por exemplos os clubes, as igrejas, os grupos de auto-ajuda, ou ainda os contatos virtuais por televisão ou computador. Produz-se uma subjetividade constantemente à mercê das semióticas modelizadoras dominantes e, portanto, em consonância com a subjetividade capitalista. A evitação da alteridade é fatal para a potência criadora da subjetividade (Caiafa, 2007, p.39).

Para Caiafa (2007) o desejo de vínculo com a cidade que não é apenas consumida e se dá pela capacidade de transformação, criação de novos caminhos subjetivos. Guattari afirma que as “engrenagens urbanas” nos interpelam, ativando afetos, modelizando focos subjetivos.  As cidades se definem em grande parte pelos processos subjetivos que deflagram. “A aventura própria das cidades envolve precisamente a produção de heterogeneidade, quando a cidade chama à exterioridade, dispersa os focos de identidade e as recorrências do familiar [...]” (Caiafa, 2007, p.39).

E, portanto, com a privatização dos subúrbios e a exclusão, é na circulação urbana que Caiafa (2007) encontra a solução enquanto grande operador de alteridade, heterogeneidade e segregação para composições subjetivas singulares.  E o setor público tem um papel definitivo, porque pode ser produtor de espaços coletivos, em que possa “desatar o laço que ata a cidade à empresa, figura central das mutações contemporâneas do capitalismo” (Caiafa, 2007, p.40).
Rafaella Prata Rabello: Jornalista pelo Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora e Graduanda do 6º período de Letras na Universidade Federal de Juiz de Fora. Bolsista Pibic/CNPq no projeto Cidade e memória: a construção da identidade urbana pela narrativa audiovisual.

Por Rafaella Prata.


Referências bibliográficas: 
CAIAFA, Janice. Aventura das cidades: ensaios e etnografias. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007.
FONSECA, Rubem. Contos reunidos. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.
GOMES, Renato Cordeiro. Todas as cidades, a cidade: literatura e experiência urbana. Rio de Janeiro: Rocco, 1994.
GOMES, Renato Cordeiro; MARGATO, Izabel (org.). Espécies de espaço: territorialidades, literatura, mídia. Belo Horizonte, Ed. UFMG, 2008.
PRYSTON, Angela; CUNHA, Paulo (orgs). Ecos urbanos: a cidade e suas articulações midiáticas. Porto Alegre: Sulina, 2008.
SOUZA, Jessé. A ralé brasileira: Quem é e como vive. Belo Horizonte: UFMG, 2009. p. 15-71.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Parâmetros de qualidade para o telejornalismo público: uma análise da TV Brasil



Apesar de a Constituição brasileira ter um capítulo sobre Comunicação Social e garantir o direito à livre expressão e à comunicação, observa-se que, de fato, ainda é pouco o que se tem realizado no sentido de possibilitar uma maior democratização da produção de conteúdos na televisão do país.  O engajamento da sociedade civil, que resultou na I Conferência Nacional de Comunicação, em dezembro de 2009, onde foram sugeridas mais de 600 propostas que mudassem a comunicação no Brasil não foi capaz de alavancar as mudanças desejadas.

Apesar de legalmente instituída pela Constituição de 1988, a comunicação pública não foi de fato criteriosamente definida, dando margem a uma espécie de contaminação, que faz com que muitas das emissoras ditas públicas estejam perigosamente marcadas por procedimentos típicos de emissoras comerciais, por exemplo.

As primeiras televisões públicas que surgiram no Brasil, no final dos anos 60 e início dos anos 70, estavam ligadas de forma muito direta ao poder estatal, seja por ligações com os governos estaduais, ou através do Ministério da Educação, dessa forma, dificilmente, poderiam representar a dinâmica social com distanciamento e de forma democrática.

Durante muito tempo, a população em geral considerou que a missão das TVs públicas seria aquela da alfabetização massiva, expressa, por exemplo, pelo Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral).

A relação entre as TVs educativas e o sistema político partidário é comprometedora quando se trata das concessões que foram efetuadas ao longo dos anos, até mesmo depois da democratização do país.  Um dos empresários de radiodifusão que esteve à frente da TVE de Juiz de Fora, Minas Gerais, de 1981 a 2000, Domingos Frias, brinca ao se referir ao sistema: “Quando saía a publicação no Diário Oficial, na página do Ministério das Comunicações: ‘edital de concorrência para o canal 10 em Juiz de Fora’, lia-se: ‘é de tal’, porque quem pedia a abertura já era carta marcada, líquido e certo para ganhar” (apud MUSSE; RODRIGUES, 2012, p. 103).

A criação da EBC – Empresa Brasil de Comunicação - é o resultado de um emaranhado jurídico que, nos anos 90, embalado pelos horizontes neoliberais, possibilitaram que sucessivas lacunas ou novas interpretações legais permitissem que muitas pequenas emissoras, sem estrutura e sem compromisso público, se transformassem em geradoras.

De qualquer forma, para atender os preceitos ditados anteriormente pela Constituição Federal, de complementaridade entre os sistemas estatal, privado e público, e como resultado da mobilização que levou à realização do Fórum da TV Pública, foi criada, em 2007, a Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), que inclui a TV Brasil.

Mas a fragilidade para manutenção dos canais locais faz com que eles tenham grande dependência do que é produzido pela TV Brasil ou pelas emissoras estaduais, como é o caso da Rede Minas, em Minas Gerais. A TVE, canal 12, de Juiz de Fora, que foi a primeira emissora educativa não governamental do país, tem uma pequena grade de programação local, muitos programas reprisados da TV Cultura, TV Brasil e Rede Minas, algumas atrações locais produzidas através de projetos de professores da Universidade Federal de Juiz de Fora, mas também veicula programas da Igreja Universal do Reino de Deus e atrações que podem ser incluídas no gênero de colunismo social, o que caracterizaria uma privatização do sistema público.

A televisão brasileira como principal meio conformador do imaginário nacional opera um empobrecimento das múltiplas identidades do país ao centralizar a produção de seus programas no eixo Rio-São Paulo. Os danos causados ao país pela existência de praticamente um modelo único de televisão, moldado de acordo com a lógica comercial, e cujo sucesso de audiência dificulta a renovação da imagem televisual, é ainda um dos grandes desafios à real democratização do país.

Autores: MUSSE, Christina Ferraz; COUTINHO, Iluska. (resumo do texto apresentado no Colóquio “Qu’est-cequ’unetélévision de qualité?” – Université Sorbonne Nouvelle – Paris 3 – 12 a 14 de setembro de 2012)

Referências:
Empresa Brasileira de Comunicação (EBC):  http://memoria.ebc.com.br/portal/empresa. Acesso em 15/07/2012.
MOTA, Regina.  O programa “Abertura” e a épica de Gláuber Rocha.  In: RIBEIRO, Ana Paula Goulart; SACRAMENTO, Igor; ROXO, Marco. História da televisão no Brasil – do início aos dias de hoje.  São Paulo: Contexto, 2010. p.137/155.
MUSSE, Christina Ferraz; RODRIGUES, Cristiano José.  Memórias possíveis: personagens da televisão em Juiz de Fora.  São Paulo: Nankin; Juiz de Fora: Funalfa, 2012.
______; PERNISA, Mila.  Telejornalimo e diversidade cultural: a tv pública e a construção de identidades. In: VIZEU, Alfredo; PORCELLO, Flávio; COUTINHO, Iluska.  60 anos de telejornalismo no Brasil: história, análise e crítica.  Florianópolis: Insular, 2010.p.179/195.
RUBIM, Antonio Albino Canelas.  Políticas culturais, diversidade cultural e realidades regionais. In: CABALLERO, Francisco Sierraet al (orgs.). Políticas de comunicação eda cultura: contribuições acadêmicas e intervenção social. V Colóquio Brasil-Espanha de Ciências da Comunicação.  Brasília: Casa das Musas, São Paulo: Intercom, 2010. p. 227/231.
STEVANIM, Luiz Felipe Ferreira.  Uma política do ver: negociações de sentido e práticas em torno do público nas políticas brasileiras de televisão.  Tese de doutorado.  Rio de Janeiro: UFRJ, 2011.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Curso de Cinema


Cartaz distribuído na época para divulgar as inscrições
Dentre os vários eventos promovidos pelo CEC - Centro de Estudos Cinematográficos de Juiz de Fora durante seu período de funcionamento (1957-1977) destaca-se o Curso de Cinema realizado em 1967, que se tornou referência nacional por ser o maior curso oferecido por um cineclube no país.

O curso planejado com o apoio da Reitoria da Universidade Federal de Juiz de Fora, do CEC - Centro de Estudos Cinematográficos de Belo Horizonte[1] e da Galeria de Arte Celina[2] fazia uma retrospectiva sobre a história do cinema desde o cinema mudo até os importantes movimentos existentes na Europa como o Neorealismo Italiano e o Expressionismo Alemão.

Ao longo do curso foram exibidos mais de 150 filmes, sendo que muitos raros como: Lousiana Story, de Flaherty; Aurora, de Murnau; a Turba, de King Vidor; Une Partie de Campagne, de Jean Renoir; Napoleão, de Gance; Ladrões de Bicicleta, de Zavattini e de Sica; afora filmes expressionistas alemães, soviéticos e franceses. Além dos filmes, foram projetados cerca de 1.400 slides sobre a história do cinema mundial.

Em média, 40 alunos participaram das atividades. Além desses, estiveram presentes importantes cineastas e críticos de cinema: Murílio Hingel, Nélson Pereira dos Santos, Maurício Gomes Leite, Paulo Emílio de Salles, Glauber Rocha, entre outros. Segundo arquivo do jornal Diário de Minas, de 22 de fevereiro de 1967:

Curso na Manchester

Dentro ou fora de currículos universitários é o melhor curso de cinema já dado no país inteiro este que se realiza, presentemente em Juiz de Fora. Esta impressão aliás não é nossa, vários dos professores(RJ, SP e BH) que por lá já passaram dizem o mesmo gravando sua opinião no livro de promoções da Galeria de Arte Celina. (DIÁRIO DE MINAS, 1967)

Haydêe Sant’Ana Arantes Graduada em Comunicação Social/ Jornalismo pela UFJF. Ex-bolsista de Iniciação Científica. Mestranda do PPGCOM-UFJF. Integrante do projeto de pesquisa: “Cidade e memória: a construção da identidade urbana pela narrativa audiovisual.


[1] CEC-BH, conhecido como CEC Minas foi fundado em 15 de setembro de 1951, na capital mineira, por Cyro Siqueira, Jacques Brandão e Fritz Teixeira de Salles.

[2] A Galeria de Arte Celina foi fundada em 1965 pela família Bracher e assumiu um importante papel na vida cultural em Juiz de Fora.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

A memória e a reescrita da história


A nossa memória é seletiva. Por uma série de fatores físicos e mentais, não lembramos de tudo o que nos aconteceu, mas somente de uma parcela dos acontecimentos. Até para nossa própria sobrevivência, não podemos lembrar de tudo, senão seríamos como o personagem Funes, o memorioso, de Borges[1], que ao se lembrar de tudo, vive para lembrar e não para viver.  Lembrar é também uma forma de esquecer. Primo Levi[2], em sua obra “Os Afogados e os sobreviventes” aponta que uma das formas para esquecer as atrocidades cometidas pelos nazistas nos campos de extermínio é lembrar e relatar o que se passou e desta forma evitar que novas experiências de extermínio acontecem. Primo Levi alerta para o desejo do esquecimento de muitos dos sobreviventes dos campos de concentração nazistas, no que ele denomina de memória da ofensa. No entanto, ele afirma que esta memória está sempre ancorada no contexto dos fatos e não é cópia fiel dos mesmos, pois “a memória humana é um instrumento maravilhoso, mas falaz”. Nesse caso, a memória de algum fato é sempre incompleta.

No entanto, sabemos que uma coisa é uma falha na memória, seja ela pessoal ou coletiva, e outra coisa é uma tentativa de reescrita da história, de forma a distorcer os fatos acontecidos. Levi relata a preocupação dos nazistas em destruir as câmaras de gás e os fornos crematórios no outono de 1944 como forma de apagar a memória, destruindo as provas do extermínio. Segundo Levi, essa “guerra contra a memória” promovida pelo Terceiro Reich foi perdida não somente pelos vestígios dos campos que restaram, mas também graças aos testemunhos dos sobreviventes. Conforme nos alerta Todorov[3], essa atitude também está presente na destruição de monumentos astecas que os espanhóis promoveram nas colônias latino-americanas como forma de suprimir a grandeza dos vencidos. A essa atitude Todorov dá o nome de supressão da memória. Ou seja, tentativa de suprimir a memória do que aconteceu como forma de apresentar outra realidade. Nesse caso, a memória é sempre vista como um inimigo nos regimes totalitários, nos quais o esquecimento é sempre providencial.

Presenciamos um exemplo de uma tentativa de reescrita da história no Brasil muito recentemente. Em julho deste ano, fui ao Rio de Janeiro para uma reunião com minha orientadora e para apresentar um paper no Encontro Nacional de História Oral. Entre um compromisso e outro almocei num restaurante do centro do Rio. Ao chegar ao restaurante verifiquei que estava passando uma matéria no Jornal Hoje sobre a morte de um bispo. O som da TV estava desligado e na tela apareciam as legendas do closed caption. Ao ver a matéria a partir da metade, pensei em se tratar de algum bispo ligado aos movimentos eclesiais de base ou à Teologia da Libertação, devido ao conteúdo apresentado pelo jornalista. Qual foi a minha surpresa ao descobrir que se tratava da morte do Cardel Dom Eugênio Salles. Fiquei um pouco preocupada, pensando que estava com problemas de memória, pois me lembrava de histórias sobre o Cardeal, ligando-o aos militares e não aos opositores do regime militar, tal como foi retratado na matéria. Fui salva pelo professor José Bessa Freire[4] que publicou uma crônica sobre o assunto, desnudando a tentativa de transformar o Cardeal em um bispo de esquerda. Em sua crônica “Um Cardeal sem passado”, prof. Bessa traça um paralelo sobre o episódio da morte de Dom Eugênio Salles e filme “Uma cidade sem passado” de Michael Verhoven sobre uma cidade alemã que esconde um passado nazista, transformando os antigos cúmplices da opressão em heróis da resistência. Bessa aponta “como o poder manipula as versões sobre a história, promove o esquecimento de fatos vergonhosos, inventa despudoradamente novas lembranças e usa a memória, assim construída, como um instrumento de controle e coerção”. Ao ler a crônica do professor Bessa, fiquei ao mesmo tempo aliviada e preocupada. Aliviada por saber que não estou com problemas de memória e preocupada em ver que mesmo nos dias de hoje, a reescrita da história continuam acontecendo e, por isso, é preciso sempre estar alerta para esse tipo de distorção da memória.

Rosali Henriques é mestre em Museologia, doutoranda em Memória Social pela Unirio - Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.



[1] No conto ‘Funes, o memorioso’, o escritor argentino Jorge Luís Borges conta a história de um homem, que após uma queda de um cavalo passa a lembrar de todos os detalhes da sua vida, sem esquecer nenhum pormenor. Esta situação leva a um esgotamento de Funes, pois ele não consegue descansar a memória. BORGES, Jorge Luis.  Funes, o memorioso. In: BORGES. Obras completas, v. 1.  São Paulo: Globo, 2000. Ficções, p. 539-546.

[2] LEVI, Primo. Os afogados e os sobreviventes: os delitos, os castigos, as penas, as impunidades.  2ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 2004

[3] TODOROV, Tzvetan. Los abusos de la memoria. Madrid: Paidós, 2000.

[4] BESSA FREIRE, José. Um cardeal sem passado. http://www.taquiprati.com.br/cronica.php?ident=989. Leia também crônica de Hildegard Angel sobre o assunto: http://noticias.r7.com/blogs/hildegard-angel/2012/07/10/dom-eugenio-salles-otima-relacao-com-os-jornais-antes-da-morte-e-depois-dela/

terça-feira, 2 de outubro de 2012

A integração da cultura e da tecnologia na era da sustentabilidade: um estudo de caso

Raruza Keara Teixeira Gonçalves1
Wanessa Dose Bittar2 


Diferentemente do contexto “guerra pelas estrelas”, nos anos 60, em que a tecnologia parecia algo distante dos indivíduos comuns ou apenas parte de projetos políticos-militares e científicos do período, a segunda década do século XXI acena para uma inversão nesse quadro, visto que a tecnologia e a cultura humana passam a ser compreendidas como indissociáveis. Nos últimos cinquenta anos, percebe-se uma aceleração do tempo, uma ideia de ruptura entre as experiências do velho e do novo, em que a dimensão do presente parece tudo tragar. O movimento grandioso de transição entre as derivas eletrônicas para às das mídias digitais, filhas da pós-modernidade, deflagrou um sentimento ora de temor, ora de supra-valorização de nossa condição de seres da técnica.

Lucia Santaella, em Cultura e artes do pós-humano, explica que esse fenômeno nada mais é que uma passagem de nossa evolução enquanto Homo socius3. Nesse sentido, disponível para ser revisitado, o passado apresenta que “depois da fala, vieram as escritas e todas as máquinas para a produção técnica de imagens, sons, audiovisuais e, atualmente, da hipermídia junto com os avanços das simulações computacionais na realidade virtual, robótica e vida artificial” 4.E esses rastros5 de nós mesmos indicam que para além da diferenciação entre tempos e espaços, a sensibilidade e o prazer estético estão presentes em nossos discursos e em ações comunicativas distintas, que se expressam em “tipografia, texturas, cores, imagens, signos e linguagens” 6. De forma que ao projetar a subjetividade do indivíduo ao alcance do social tem-se a forma para operar os muitos cruzamentos entre as possibilidades humanas e o processo tecnológico. A valorização dos novos ambientes socioculturais e a necessidade de medidas, que se comprometam com sustentabilidade e o desenvolvimento social, são pontos afins de nosso projeto que busca estabelecer a relação entre capital humano e cultural e a implementação de uma tecnologia social.

A matéria “Projeto de SP visa reutilizar retalhos de tecido para evitar desperdício” 7, de Fábio Turci, veiculada no Jornal Nacional do dia nove de julho e ainda disponível no site do telejornal, oferta uma questão relevante quanto ao uso de resíduos na criação de novos artefatos de consumo humano, no momento, em que se vislumbra um novo pensamento em direção ao impacto das ações dos indivíduos nomeio ambiente. Alguns dados dessa notícia nos chamam a atenção por nos apresentarem como a avalanche de retalhos de tecidos dispensados dia-adia pelas fábricas têxteis e confecções de roupas em todo o Brasil, geram um ciclo viciado no quesito do diga não a sustentabilidade. Isto porque, de acordo com os números apresentados pelo o jornal audiovisual mais tradicional do país, só em 2011, o Brasil importou 13 mil toneladas de retalhos, vindos principalmente de países europeus. Fato discrepante, visto que o país produziu, no mesmo ano, 175 mil toneladas, conseguindo reaproveitar desse montante apenas 36 mil na produção de barbantes, mantas e novas peças de roupas e fios. É fato, que essa questão do desperdício nos leva além de uma resolução simplificadora, afinal, ela depende de um esforço conjunto, que repense as tecnologias sociais, a iniciativa de órgãos públicos e privados e de meros mortais, que consomem e produzem lixo diariamente. De tal forma, que talvez a maneira como nos relacionamos com o residual, necessite não só de um novo olhar sobre o que é lixo, mas sim na forma de pensar, de criar, “de ser e fazer cultura a partir dele”. Ser cultura em prol do aproveitamento de resíduos é mais que forjar medidas sustentáveis, a partir da disseminação de sacolas ecológicas ou de práticas de reconhecimento do lixo em orgânico ou não por meio de tamboretes multicoloridos. Já que, essas medidas só poderão se efetivar como disciplinares na questão ambiental, se de fato conseguirem transpor as situações de descartar o lixo para as situações que envolvam o não produzir o lixo ou reaproveitamento do mesmo. A ideia de um consumo sustentável está imbricada nessas prerrogativas. Por isso, para ser a cultura do sustentável, é necessário fazer cultura através do que nos parece improvável, diminuto e escasso, é lançar mão de nossas possibilidades criativas a fim de reinventar o descartável, o residual.

O conceito do projeto8 foi elaborado a partir dessas postulações. Por meio da apropriação de restos de tecidos, lãs, couros, miçangas, fitas de cetim, correntes de metal e linhas, criou-se uma coleção de acessórios de moda. Sendo utilizada a técnica do crochê, ponto leque e ponto duplo com utilização de restos de materiais usados na confecção de roupas e em bijuterias em geral. Esta criação tem como prioridade ser uma cadeia produtiva sustentável, assim, tudo o que foi utilizado na confecção de nossa bolsa e cinto, peças maiores, foi também destinado à confecção dos acessórios de moda propostos. De forma a não descartar nenhum resíduo por menor que fosse sua dimensão em comprimento e largura. Reduziu-se a possibilidade de gerar lixo, incorporando à base estrutural dos acessórios, feita em crochê, todos os pequenos pedaços de tecido, lã e fitas que sobraram. No caso do colar, que tem a base circular em plástico, encapada também com crochê, buscou-se mais elementos têxteis, como restos de tecidos e pedaços de lãs maiores. Como em um retrato da bagunçada caixinha de aviamentos de vovós espalhadas por Minas Gerais e em tantos outros cantos do mundo, o trabalho busca criar a sensação de multicores e texturas, encobrindo, de certa forma a base onde se deposita os residuais. Além disso, uniu-se a característica artesanal à possibilidade de manutenção de uma produção nesse sentido, visto que reaproveita-se resíduos, como também utiliza-se de materiais disponíveis no mercado de aviamentos em geral. Portanto, o trabalho une artesanato e sustentabilidade ambiental e cultural à produção industrial, o que nos garante a viabilidade econômica dessas criações. Adota-se, então, a ideia central de Peter Drucker, “o equilíbrio de uma sociedade está em sua capacidade de compatibilizar tradição com modernidade, passado com futuro” 9.

http://g1.globo.com/videos/minas-gerais/t/todos-os-videos/v/designers-de-juiz-de-fora-mg-sao-finalistas-em-concurso-do-sebrae/2147754/


1 Graduada em Comunicação Social/Jornalismo pela UFJF . Ex-bolsista de Iniciação Científica. Mestranda do PPGCOM/UFJF. Integrante dos projetos de pesquisa “Cidade e memória: a identidade urbana pela narrativa audiovisual”. Gestora de marketing e produtora de moda da EntreNós. Email: raruzakeara@yahoo.com.br
2Graduada em Artes Visuais pela UFJF- Ex- bolsista de extensão da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares de UFJF. Pós graduada em Engenharia de Produção pela UFJF. Consultora na área de desenvolvimento de projetos de produtos personalizados e em projeto de serviço. Email:wanessabittar@yahoo.com.br
3 BERGER, Peter L.; LUCKMANN, Thomas. A construção social da realidade: tratado de sociologia do conhecimento. 27 ed. Petrópolis: Vozes, 2007.
4 SANTAELLA, Lucia. Cultura e artes do pós-humano. São Paulo: Paulus, 2003 p.245.
5 Os rastros nos apresentam caminhos percorridos por outros homens em outros tempos. Homens que construíram suas histórias de vida, logo, deixando suas marcas. Os rastros são, antes de mais nada, signos de representação. BABOSA, Marialva Carlos. Meios de Comunicação e história: um universo de possíveis. In: Mídia e Memória A produção de sentidos nos meios de comunicação. Mauad X. Rio de Janeiro, 2007, p. 15-34. Org: RIBEIRO, Ana Paula Goulart; FERREIRA, Lúcia Maria Alves.
6 PRYSTHON, Angela; CUNHA, Paulo (orgs.). Ecos urbanos: a cidade e suas articulações midiáticas. Porto Alegre: Sulina, 2008, p.117. 7 Disponível no site: http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2012/07/projeto-de-sp-visa-reutilizar-retalhos-de-tecido-para-evitar-desperdicio.html. Data de acesso 15/07/2012.
7 Disponível no site: http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2012/07/projeto-de-sp-visa-reutilizar-retalhos-de-tecido-para-evitar-desperdicio.html. Data de acesso 15/07/2012.

8 O projeto Tratamento de superfície de crochê com resíduos é um dos classificados do Prêmio Sebrae Minas de Design 2012 na categoria resíduos. O nome dos classificados está disponível: http://www.premiosebraeminasdesign.com.br/finaslitas-e-classificados-2012. E no Catálogo do SEBRAE/ Se funciona é design.
9 NETO, Eduardo Barroso. Design, identidade cultural e artesanato. Disponível em htpp://www.eduardobarroso.com.br/artigos.htm. Data de acesso em 8 de set. 2010.



segunda-feira, 24 de setembro de 2012

A cidade, a ditadura e os estudantes

Juiz de Fora ficou conhecida nacionalmente como a cidade de onde partiu o Golpe Civil Militar. Mais recentemente, a divulgação de um depoimento da presidente Dilma Rousseff onde relatou sua passagem pela cidade, identificou Juiz de Fora como um centro de tortura e colocou-a na memória nacional como uma cidade reacionária. Mas uma cidade traz consigo marcas de diferentes citadinos que a praticaram. Histórias e memórias que se sobrepõem, constituindo-se fios que ao serem tecidos formam a história da cidade.

Juiz de Fora não tem apenas as marcas reacionárias durante a Ditadura Civil Militar Brasileira. Seus praticantes a fizeram palco de importantes lutas na busca pelas liberdades democráticas. Dentre estes representantes de uma história de oposição e de resistência, destaco o Movimento Estudantil, formado por seus diversos militantes, seja da geração de 1968, que enfrentou os anos mais duros da repressão militar, seja a geração da transição dos anos 1970, que lutou pelas liberdades democráticas. Na cidade, a cultura serviu como forma de mobilização em diferentes momentos e, entrelaçada aos discursos da juventude com horizontes utópicos, tornou-se o substrato onde a arte floresceu.

O movimento estudantil juizforano integrava-se às lutas embrenhadas por todo o país e levava à cidade a se envolver em uma luta ampla pelo fim da Ditadura. Quando o apito da panela de pressão soou nos grandes centros, representando uma ebulição dos movimentos sociais e um protagonismo destes no processo de transição, alargando seus limites, o movimento estudantil de Juiz de Fora foi pra rua, enfrentou a ditadura e lutou pelas melhorias na universidade, por mais verbas para a educação, pela melhoria no transporte para o campus da UFJF, e junto com esta pauta levava a luta “pelas liberdades democráticas”. Os estudantes enfrentaram a policia e cachorros, como no caso da conhecida Greve dos Cachorros no ano de 1978, viam nos políticos da ARENA e no reitor da universidade, indicado pelo presidente, os braços da ditadura na cidade. Os estudantes juizforanos também estiveram presentes no Congresso de Salvador, para reconstruir a UNE, lutaram pela anistia política, construíram partidos, integraram a vida política e levaram o Brasil para construir sua democracia.

Por tudo isso, convido você a pensar Juiz de Fora para além de suas marcas reacionárias, mas entendê-la como uma cidade que tem em sua história as marcas da memória daqueles que lutaram pelo fim da ditadura e defenderam a democracia. Esta história e estas memórias são o que pesquiso.

Gislene Lacerda. Doutoranda em História Social – PPGHIS / UFRJ; Autora do livro: “Memórias de Esquerda: o Movimento Estudantil em Juiz de Fora de 1974 a 1985”.



domingo, 16 de setembro de 2012

Cosmopolitismo desperdiçado


Dizer uma cidade é rascunhar a partitura de uma polifonia. São muitas línguas, sotaques vários, entonações dissonantes, dialetos cruzados. Uma cidade se diz no local e no estrangeiro, porque aspira e se realiza como tal apenas no ser cosmopolita. Depois de 27 anos nesta cidade, ainda não encontro resposta para a indagação que certa vez me dirigiu um poeta, artista plástico e jornalista local, hoje radicado em Belo Horizonte: “Por que Juiz de Fora não se tornou cosmopolita?”

Apenas consigo acrescentar a esta uma outra pergunta: “Por que, mal aqui desembarcam, os ‘estrangeiros’ se tornam juizforanos?” E ainda que não nos seja possível definir objetivamente esse ser-juizforano, ao menos um traço ressalta e contamina todos. Trata-se de um olhar excessivamente crítico sobre a cidade, se não desprezo, uma indiferença, um certo pas mal esnobe em relação ao clima, à topografia, à cultura, às questões locais. Para esse enigmático ser-juizforano, a cidade é mera passagem, lugar de trânsito e de eternos trânsfugas. Por isso, raros são os estrangeiros que acrescentam à cor local as tonalidades de suas cidades e países.

 Como professor da UFJF já tive alunos de São Paulo e do Pará, do Espírito Santo e do Triângulo Mineiro, de Angola e de Moçambique, do Japão e do Peru. Onde as línguas, sotaques, entonações, dialetos, as cores e a cultura desses estrangeiros? Parece que a hospitalidade do ser-juizforano não ultrapassa o nível da acolhida física. E assim os estrangeiros logo se tornam locais, assumindo os nossos defeitos e qualidades. Seja pela ausência de meios adequados ou pela contaminação do ser-juizforano, tais estrangeiros são compelidos a também habitar a cidade como um lugar de passagem, onde apenas por esquecimento se deixa algo: um botão, um bilhete, um disco, uma lembrança rasurada.

A construção de uma identidade histórica e afetiva de Juiz de Fora deve privilegiar estratégias de afirmação do cosmopolitismo, resgatando as origens polifônicas da cidade (negros, alemães, sírios, italianos, portugueses, libaneses etc.) e criando espaços para a incorporação de manifestações multiculturais. A continuar o desperdício deste cosmopolitismo latente, Juiz de Fora corre o risco não apenas de permanecer na contramão do provincianismo, mas de declinar do papel de pólo regional, de cidade educadora, de paradigma da Zona da Mata.

Trata-se, antes de tudo, de forjar uma identidade, uma imagem de Juiz de Fora, na qual os seus habitantes possam ler o que a cidade produz e contém. Desta forma, a mentalidade do ser-juizforano se fará disponível para acolher todas as dimensões do outro, para acrescentar-se das mínimas diferenças do estrangeiro. Seria desnecessário dizer que a urdidura desta imagem identitária de Juiz de Fora deve passar necessariamente pela cultura e pela arte, pela divulgação ampla e sistemática das representações literárias, plásticas e teatrais que se fez e se faz da cidade. De modo que, tanto para os seus habitantes quanto para os estrangeiros, Juiz de Fora se torne uma cidade visível.

Fernando Fiorese 


COMMUNICATION, CITY AND MEMORY


This space is aimed to gather thoughts on the interfaces established among the narratives that constitute the communication processes, the sociability established in the urban centers and the memory recognized as identity and cultural mark of our societies.
This space is neither restricted nor is it meant to be. Certainly, it reveals part of the intellectual production of a cunning group of professors, workers and students of the Federal University of Juiz de Fora, which has chosen to think about this issue and renew it with substantial contributions.
The blog’s proposal is to overcome the barriers of the academic world and integrate new minds into the group, as well as highlight the issues discussed in the meetings of the research and extension projects, so that the vitality of these discussions can go beyond the constraints of time and space, and reach a far greater audience.
The reflection (and the passion) must drive our group in order to motivate our hearts and minds and make them aware of a more critical reading of means of communication, of the life in the cities and social memory, as raw materials for the understanding of the others and of the scenarios in which we are inserted.
The technology is our ally in the diffusion and integration of knowledge we produced to other groups of reflection. We wish to create a network of information and affection, in which the ideas can move freely and can collaborate in the construction of a more human and righteous society.

Christina Ferraz Musse


Versão em português

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

IV Seminário Memória: Patrimônio, Oralidade e Acervo 19 a 21 de setembro

INSCRIÇÕES PRORROGADAS ATÉ O DIA 18 DE SETEMBRO DE 2012 OU ENQUANTO HOUVER VAGAS

Local: Auditório do Banco do Brasil
Rua Halfeld, 770 – Centro.
Juiz de Fora – Minas Gerais.


Objetivos:
- Possibilitar a reflexão sobre os vários aspectos que envolvem a construção da memória;
- Enfatizar a importância da entrevista oral como fonte de pesquisa;
- Conhecer novas formas de acesso aos acervos de instituições;
- Difundir o conhecimento da metodologia e catalogação de bens culturais de modo a contemplar a diversidade cultural;
- Debater sobre a preservação do patrimônio cultural na gestão e planejamento do desenvolvimento urbano;
- Proporcionar a difusão de experiências e potencialidades educativas dos museus, bem como a relação destes com a sociedade.


Público alvo: Historiadores, pesquisadores, arquitetos e urbanistas, jornalistas, artistas plásticos, pedagogos, psicólogos, museólogos, turismólogos, bibliotecários, estudantes e comunidade em geral.


Inscrições: 03 de setembro a 14 de setembro de 2012, das 8h às 12h e das 14h às 18h.
Local: Funalfa, Avenida Barão do Rio Branco, 2234 – Centro. Juiz de Fora – Minas Gerais.
E-mail: dipac.funalfa@gmail.com
Fones: (32) 3690-7327 e (32) 3690-7034


Número de vagas: 150.


Programação:


19/09 – Quarta-feira:
9h – Credenciamento.
9h30 – Abertura oficial: Superintendente da Funalfa Antonio Carlos Siqueira Dutra.
10h00 – Palestra: História Oral e Memória. Profª Drª Mirian Hermeto (Núcleo de História Oral FAFIEH/UFMG).
Intervalo
14h – Palestra: Digitalização de acervos e as políticas de disponibilização em rede. Profº. Ms. Pedro de Brito Soares (Diretor de Conservação de Documentos do Arquivo Público Mineiro).
15h – Debate.
15h30 – Café.


20/09 - Quinta-feira:
9h - Mesa Redonda: Memória Afrodescendente de Minas Gerais. Profª. Maria Luiza Higino Evaristo, Ms. Gilmara Santos Mariosa, Profª. Ms. Giane Elisa de Almeida. Mediador: Profº Drº Ramsés Albertoni Barbosa.
10h30 – Debate
11h – Café
Intervalo
14h – Palestra: Inventário de Referências Culturais em Ribeirão Preto. Drª. Adriana Silva (Secretária da Cultura de Ribeirão Preto, Doutora em Educação.).
15h – Palestra: Patrimônio Cultural e Planejamento Urbano. Profª Drª Maria Cristina Rocha Simão (Diretora de Pesquisa, Graduação e Pós-Graduação do IFMG Campus Ouro Preto).
16 h – Café
16h15 – Debate


21/09 - Sexta-feira:
9h – Palestra: Museus e Educação. Dra. Maria Esther Valente [Coordenadora de Educação em Museus - CED / Museu de Astronomia e Ciências Afins - MAST / ICOM-BR (Conselho Internacional de Museus)]
10h - Palestra: Museus, Patrimônio e Sociedade. Ms. Cícero Antônio F. de Almeida (Coordenador do Patrimônio Museológico – CPMUS- IBRAM / UNIRIO)
11h – Café
11h15 – Debate

domingo, 9 de setembro de 2012

O Diário Mercantil e o I Festival de Cinema Brasileiro de Juiz de Fora


A década de 60 é considerada por alguns historiadores como os “anos rebeldes” devido aos vários movimentos de contracultura que ocorreram naquela época. O mundo estava alavancado pelas inovações tecnológicas que progrediam e entusiasmavam o homem. Certamente, a política era o combustível que mais fermentava este progresso fascinante.

Apesar da maior parte da década de 1960 estar sob o regime militar, Juiz de Fora tinha uma produção cultural fervilhante. Os militares certamente pensavam que a vitória armada era a vitória sobre o comunismo, mas não poderiam imaginar que a esquerda fazia política ocupando os cargos intelectuais em jornais, universidades e tornava-se a classe de expressão no país.


O PCB (Partido Comunista Brasileiro) contribuiu significativamente para o debate cultural tão valorizado daquele período, principalmente pela forte militância dos jovens que, ligados também à Universidade Federal de Juiz de Fora, discutiam assuntos relacionados à política nacional, à vida na cidade, à família, empreendendo discussões teóricas significativas daquele período, movimentando forças contestatórias e críticas. É em meio a esta florescente vida cultural, universitária e política que é concebido e realizado o I Festival de Cinema Brasileiro de Juiz de Fora, entre os dias 28 e 31 de maio de 1966. O evento contou com a ampla cobertura do jornal impresso “Diário Mercantil” que levou à população da época todas as principais informações sobre o dia-a-dia do Festival.

Mais do que uma cobertura factual daquele momento, nas páginas amareladas e já muito maltratadas pelo tempo do jornal DM estão delineados os reflexos de uma cidade que respirava cultura e que produziu o primeiro Festival de Cinema do Brasil. Graças ao jornalismo produzido naquela época podemos vislumbrar, pela fechadura da memória, o cenário histórico e social de uma cidade que hoje permanece viva apenas na lembrança daqueles que usufruíram as dores e as delícias dos anos 60.

Ferramenta da memória, que permite ao presente a observação de fatos pretéritos, o “Diário Mercantil” converte-se também em objeto da análise científica, funcionando como um instrumento de apoio ao pesquisador, fornecendo-lhe os dados de que este necessita para empreender um estudo objetivo e reflexivo sobre o passado, suas peculiaridades, o modo de ser de uma cidade e a maneira pela qual era contada e transmitida sua história.  

Karina Menezes Vasconcellos

MUSSE, Christina Ferraz. Impressa, cultura e imaginário urbano: exercício de memória sobre os anos 60/70 em Juiz de Fora. Juiz de Fora: Funalfa, 2008.

NASCIMENTO, Durbens Martins. Guerrilha no Brasil: uma crítica à tese do “Suicídio Revolucionário” em voga nos anos 80 e 90. 2004. Disponível em: <http://www.historia.uff.br/cantareira/novacantareira/artigos/edicao5/guerrilha.pdf>. Acesso em: 18/07/2012. 

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Cine Brasil é cenário de exibição em festival de cinema Rio Branquense

Prédio do Cine Brasil


Na pequena cidade de Visconde do Rio Branco foi fundada em 1910 a Empresa Teatral Rio Branquense, que mais tarde recebeu o nome de Cine Brasil. Exibindo filmes desde o tempo do cinema mudo, sua função ia além daquelas esperadas para um cinema normal. Convenções políticas, festas, inaugurações, premiações e muitos outros eventos ocorriam no palco que havia frente à tela de exibições. 

“O cinema se misturou com a parte social durante sua vida inteira e isso foi muito importante para nós porque não tínhamos nem outra diversão, todo mundo ia para o cinema. Ele tinha coxia porque era um teatro também, com medidas exatas de palco, como os melhores teatros do Rio", afirmou a diretora do Museu Municipal de Visconde do Rio Branco Teresinha de Almeida Pinto.

Fechado há mais de 40 anos, o Cine Brasil foi cenário de exibição no dia 28 de julho de 2012 do filme “Eu é Geraldo” de Erick Leite, no primeiro Festival de Cinema Rio Branquense Geraldo Santos Pereira.


Imagem do 1º Festival de Cinema Rio Branquense Geraldo Santos Pereira. Com o Cine Brasil ao fundo



“A exibição vai ser em frente ao Cine Brasil porque vai repetir a formatação do espetáculo na vinda do Geraldo Santos Pereira em 2006, quando ele exibiu o filme ‘O Aleijadinho’ lá em frente ao Cinema Brasil. Então, a razão é essa. E também não teríamos um lugar mais significativo e melhor do que lá", explicou um dos organizadores do festival, Franklin Ferreira Netto.

Atualmente o prédio do antigo Cine Brasil, que é tombado como patrimônio histórico, tornou-se ponto comercial, subdivido em quatro lojas. Franklin manifestou um desejo por parte da organização do evento de que o prédio volte um dia a exibir filmes ou então seja reativado como um centro cultural, mas deixou claro que, para o andamento dessa ideia, primeiro é necessário fazer um levantamento de tudo o que foi alterado no interior do cinema.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Audiovisual da minoria no YouTube e a construção de identidades


A web se tornou um espaço que promove a visibilidade do cotidiano tanto do indivíduo quanto do seu grupo social. A cidadania aparece independente do monopólio da mídia. Existe uma relação de maior proximidade com a técnica audiovisual devido à facilidade de produzir e postar conteúdos nos sites. Neste contexto, o hip hop aparece como a maior expressão identitária das culturas marginais, devido ao fato de sua linguagem trabalhar os conteúdos de uma maneira reivindicatória.

Através da listagem dos dez vídeos mais acessados no buscador do site, ligados à palavra-chave “periferia Juiz de Fora” e “comunidade Juiz de Fora” pretendemos perceber como esses conceitos são utilizados na representação de populações carentes. Observamos que os vídeos que aparecem no buscador do YouTube, referentes à periferia ou à comunidade de Juiz de Fora mostram que não existe um volume considerável de representações que são realmente tradutoras do cotidiano das minorias da cidade. Na pesquisa relacionada ao termo periferia foram encontrados apenas 20 vídeos, sendo que cinco trazem clipes de hip hop. Já com o conceito de comunidade os resultados são mais expressivos com 376 vídeos que em sua maioria são sobre música gospel.

Percebemos assim, o cuidado que as minorias têm na escolha dos termos comunidade e periferia, quando são selecionados para representarem suas produções audiovisuais na web. Periferia é mais associada ao movimento hip hop, enquanto que comunidade é mais identificada no discurso de grupos religiosos. O gospel aparece refletindo o modismo das composições na contemporaneidade. A popularidade do gênero é uma demanda latente do marketing dos CD’s, shows e eventos, o que pode interferir nas postagens de vídeos encontradas no YouTube.

Diferentemente dos grandes centros urbanos, como São Paulo e Rio de Janeiro, Juiz de Fora se mostra como uma cidade que ainda não possui uma cultura voltada para a mobilização social, preocupada em tratar temas de interesses comuns dos cidadãos. Outra hipótese é que o acesso às novas tecnologias ainda não seja um privilégio de todos.


Alguns vídeos ainda precisam da colaboração de grupos que possuem uma formação profissional para serem realizados ou ainda são propostos e dirigidos por pessoas que se
interessam por essas comunidades. Talvez seja necessária uma política voltada para a educação dessas populações favorecendo a produção de seus próprios conteúdos, ganhando assim uma independência em relação à forma e o conteúdo, a edição e a postagem de suas produções.


Rafaella Prata RabelloJornalista pelo Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora e Graduanda do 6º período de Letras na Universidade Federal de Juiz de Fora. Bolsista Pibic/CNPq no projeto Cidade e memória: a construção da identidade urbana pela narrativa audiovisual

E-mail: rafaella_prata@hotmail.com


Referências

BARBALHO, Alexandre. Cidadania, minorias e mídia: ou algumas questões postas ao liberalismo. In: PAIVA, Raquel e BARBALHO, Alexandre (orgs.). Comunicação e cultura das minorias. 1 ed., São Paulo: Ed Paulus, 2005.


FERREIRA, Jairo; VIZER, Eduardo (orgs) Mídia e movimentos sociais: linguagens e coletivos em ação. São Paulo: Ed Paulus, 2007. – (Coleção Comunicação)


LEONEL, Juliana; MENDONÇA, Ricardo Fabrino (orgs). Audiovisual comunitário e educação: histórias, processos e produtos. Belo Horizonte: Ed Autêntica, 2010.


LÉVY, Pierre. A Inteligência Coletiva. 4ª ed. São Paulo: Loyola, 2003


OLIVEIRA, Henrique Luiz Pereira. Tecnologias audiovisuais e transformação social: o movimento do vídeo popular no Brasil (1984-1995). 2001. Tese (Doutorado em História) – Faculdade de Ciências Sociais, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2001.


PAIVA, Raquel. O espírito comum. 1 ed., Petrópolis, RJ: Ed Vozes, 1998.


PEREIRA, André Luiz; FAGUNDES, Daniel; SOARES, Diego F. F., SOARES, Fernando Solidade. Para reinventar o vídeo e a periferia: vídeo popular, cinema de quebrada, vídeo comunitário, audiovisual periférico... Ser ou não ser?


PRYSTON, Angela; CUNHA, Paulo (orgs). Ecos urbanos: a cidade e suas articulações midiáticas. Porto Alegre: Ed Sulina, 2008.


SODRÉ, Muniz. Antropológica do espelho: uma teoria de comunicação linear e em rede. Petrópolis, RJ: Ed Vozes, 2002.




sexta-feira, 10 de agosto de 2012

O lugar do imaginário

As metáforas arqueológicas são as que melhor dizem da relação do homem com as cidades. Habitar uma cidade é escavar as camadas de tempos e espaços, acumuladas e justapostas pelo trabalho de gerações. Labirinto ou Babel, a cena da cidade é menos a matéria concreta de ruas, construções e alguns poucos resíduos naturais do que as imagens e textos registrados na memória e no imaginário dos seus cidadãos.
Mesmo sem a viagem física, ao leitor contumaz é possível dizer da Berlim de Theodor Fontane e Walter Benjamin, da Paris de Charles Baudelaire e Victor Hugo, do Rio de Janeiro  de Machado de Assis e João do Rio, da São Paulo de Oswald e Mário de Andrade. Mas será possível, a nós, habitantes desta cidade, dizer da Juiz de Fora de Pedro Nava, de Murilo Mendes, de Rachel Jardim e tantos outros?
A ênfase excessiva nos aspectos materiais da cidade muitas vezes oblitera a nossa capacidade de pensá-la pelo viés da memória e do imaginário de seus habitantes. Mesmo porque, ao contrário do que acontece em Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte e Rio de Janeiro (apenas para citar as mais óbvias), as instituições públicas e privadas de Juiz de Fora muito pouco têm-se empenhado na construção de uma identidade histórica e afetiva da cidade.
Enganam-se os que pensam habitar apenas uma cidade física. Como um duplo, a Juiz de Fora da nossa memória nos habita, assombra a matéria do presente. Mesmo desfigurados ou extintos, os lugares e os acontecimentos pretéritos nos assaltam. A paisagem interditada por algum edifício nos espreita quando dobramos uma qualquer esquina. O tempo morto retorna diante do último resíduo arquitetônico do Cine Paraíso.
Habitar uma cidade é aprender a escavar as camadas de tempo e espaço que nos conformam enquanto cidadãos. Onde a Juiz de Fora de Murilo Mendes, cercada de pianos por todos os lados? Onde a Rua Halfeld como um rio de Pedro Nava? Onde as “Imagens de Juiz de Fora” cantadas por Manuel Bandeira? Onde os personagens anônimos de 150 anos de história? Infelizmente enclausurados em livros, álbuns de família, papéis devastados pelo tempo e algumas poucas memórias privilegiadas.
Não se trata de nostalgia nem de anacronismo. Para construir a cidade de todos e de cada um, urge tornar coletivos a memória e o imaginário de Juiz de Fora. Planejar uma cidade para o século XXI implica antes construí-la em nosso imaginário, uma obra antes afetiva do que material. E decerto, possibilitar o acesso dos cidadãos aos textos e imagens que registram o passado e o presente de Juiz de Fora é permitir que possamos encontrar a nossa identidade, mesmo que precária.
No plano das mentalidades, urge um plano estratégico que resulte em investimentos na construção de uma identidade afetiva e histórica de Juiz de Fora, na qual inscrevemos medos, esperanças e utopias para construir a cidade que nos habita na cidade que habitamos.
Fernando Fiorese